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domingo, 29 de agosto de 2010

Resumo Aula 24/08/2010

Pessoal, Aziz Nacib Ab'Saber e Bertha Becker
Ih! Tá com um buraco de uma semana!
Na aula do dia 17 finalizou-se a discussão sobre o primeiro texto "O debate modernidade/pós-modernidade e a renovação do discurso do planejamento", de Miguel Aguilar-Robledo.Longo texto, muitos conceitos novos, longas discussões. Finaliza a aula com a distribuição de materiais de Planos Territoriais para cada grupo, juntamente com um roteiro de análise dos planos.
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A proposta da aula do dia 24/08/2010 é finalizar a atividade da aula anterior. A medida que os grupos socializam sua análise para o resto da turma, algumas críticas são feitas, levanta-se pontos para discussão e reflexão que foram anotados aqui (mas só as idéias principais...):

- As grandes políticas públicas tratam questões ambientais como questões externas, fora de pauta. Isso pode ser visto na distribuição de investimentos do Estado.
- Um exemplo que internaliza a questão ambiental em políticas públicas é a obrigatoriedade de comprar alimentos orgânicos que irão para a merenda de esclas municipais (Não sei se isto vale para o Brasil inteiro, mas pude ver isso de perto em uma comunidade ribeirinha no município de Iranduba, perto de Manaus).

- Critérios ecológicos são importantes para serem considerados, mas se desconexos da sociedade, passam a gear conflito entre conservação e ocupação.
- Definir zonas de uso e restrição é uma escolha social e pode considerar aspectos científicos, sociais, etc.
- O Zoneamento Ecológico Econômico foi uma reivindicação (eu nunca conseguia escrever esta palavra!) de vários setores - sociedade civil, academia, estado, indústrias.
- O grande Aziz Nacib Ab'Saber e Bertha Becker (li esse livro dela, muito bom: Becker, Bertha K. Amazônia: Geopolítica na virada do III milênio.1ªed. Rio de Janeiro: Garamond, 2004, 172p.) estiveram a frente pela criação das ZEE. Não foi apenas uma luta do movimento ambientalista. As indústrias também, pois queriam saber quais áreas poderiam explorar.

- A interdisciplinaridade é fundamental no processo de Planejamento Ambiental, buscando outros referenciais e demanda vontade e desprendimento para dedicar-se a outros campos do saber. (Ou seja, ser bitolado não rola)

- Lembramos mais uma vez que a Universidade não é neutra. (E o texto de Boaventura Santos pode dar mais subsídeos de como essa falsa neutralidade pode ficar ainda pior).

- Uma observação relevante sobre o acesso aos materiais analisados: Alguns possuem um bom embasamento científico do ponto de vista técnico e propostas de ação bem feitos, (tal como o Programa de Gestão para desenvolvimento sustentável da bacia contribuinte à Baia de Ilha Grande) porém o acesso a este material é restrito, ou pelo menos desconsiderados pelos tomadores de decisão (e não acessível aos cobradores de decisão?). (O professor disse que vai deixar este material disponível na biblioteca). =)
-O que predomina mais uma vez são os interesses da "mão invisível do mercado" de Adam Smith (mão medonha por sinal), reforçando a discussão do início desta aula, que "as grandes políticas públicas tratam questões ambientais como questões externas". (Sendo assim, o que cabe a nós dentro da Universidade?)

Encerra-se a socialização dos materiais de planos territoriais.
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Início da revisão: PARADIGMAS EPISTEMOLÓGICOS DO PLANEJAMENTO
Episte = Conhecimento + Lógico = Lógica

- Pressupostos teóricos do desenvolvimento do saber científico:
- Desde a racionalidade da ciência moderna que forja-se no século XVI, a partir do Renascimento;
- Supera o domínio ideológico da Igreja;
- Demanda do mercantilismo por novas tecnologias;
- O impirismo como método;
- Sob a perspectiva moderna Boaventura Souza Santos (olha ele aí de novo) e Chalmers dizem que a ciência busca leis gerais, leis universais;
- Aí entra o positivismo científico: em linhas gerais, observar, quantificar e representar matematicamente, desconsiderando certos elementos que compõem o todo, ou seja, reduzindo a complexidade;
- Complexidade trazida com grande embasamento teórico com Fritjof Capra (autor de O Tao da Física, Teia da Vida e Ponto de Mutação- que virou filme - 4 . vc tem?) e Edgar Morin (um dos grandes pensadores da França e do mundo sobre Educação e complexidade, escreveu um tantão de livros também);
- Por fim, uma breve revisão do texto"O debate modernidade/pós-modernidade e a renovação do discurso do planejamento", de Miguel Aguilar-Robledo, ligando o desenvolvimento do saber científico com os pontos centrais do embate teórico sobre os limites do planejamento moderno.
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E a aula da tarde?

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE SABERES TRADICIONAIS, BIODIVERSIDADE, BIOTECNOLOGIA E DINÂMICAS TERRITORIAIS - SINBIOTEK


http://200.137.221.78/SIEC/portalproec/sites/gerar_site.php?ID_SITE=2841

Livro em PDF: Turismo de Base Comuitária


http://www.turismo.gov.br/export/sites/default/turismo/programas_acoes/regionalizacao_turismo/downloads_regionalizacao/TURISMO_DE_BASE_COMUNITxRIA.pdf

A desuniversidade

A desuniversidade

O projeto de reforma da universidade européia corre o risco de virar uma contra-reforma. Caso isso ocorra, os critérios de mercantilização reduzirão o valor das áreas de conhecimento ao seu preço de mercado e o latim, a poesia ou a filosofia só serão mantidos se algum macdonald informático vir neles utilidade.
O processo de Bolonha — a unificação dos sistemas universitários europeus com vista a criar uma área europeia de educação superior — tem sido visto como a grande oportunidade para realizar a reforma da universidade europeia. Penso, no entanto, que os universitários europeus terão de enfrentar a seguinte questão: o processo de Bolonha é uma reforma ou uma contra-reforma? A reforma é a transformação da universidade que a
prepare para responder criativamente aos desafios do século XXI, em cuja definição ela ativamente participa. A contra-reforma é a imposição à universidade de desafios que legitimam a sua total descaracterização, sob o pretexto da reforma. A questão não tem, por agora, resposta, pois está tudo em aberto. Há, no entanto, sinais perturbadores de que as forças da contra-reforma podem vir a prevalecer. Se tal acontecer, o cenário distópico terá os seguintes contornos.

Agora que a crise financeira permitiu ver os perigos de criar uma moeda única sem unificar as políticas públicas, a política fiscal e os orçamentos do Estado, pode suceder que, a prazo, o processo de Bolonha se transforme no euro das universidades europeias. As consequências previsíveis serão estas: abandonam-se os princípios do internacionalismo universitário solidário e do respeito pela diversidade cultural e institucional em nome da eficiência do mercado universitário europeu e da competitividade; as
universidades mais débeis (concentradas nos países mais débeis) são lançadas pelas agências de rating universitário no caixote do lixo do ranking, tão supostamente rigoroso quanto realmente arbitrário e subjetivo, e sofrerão as consequências do desinvestimento público acelerado; muitas universidades encerrarão e, tal como já está a acontecer a outros níveis de ensino, os estudantes e seus pais vaguearão pelos países em busca da melhor ratio qualidade/preço, tal como já fazem nos
centros comerciais em que as universidades entretanto se terão
transformado.

O impacto interno será avassalador: a relação investigação/docência, tão proclamada por Bolonha, será o paraíso para as universidades no topo do ranking (uma pequeníssima minoria) e o inferno para a esmagadora maioria das universidades e universitários. Os critérios de mercantilização reduzirão o valor das diferentes áreas de conhecimento ao seu preço de mercado e o
latim, a poesia ou a filosofia só serão mantidos se algum macdonald informático vir neles utilidade. 

Os gestores universitários serão os primeiros a interiorizar a orgia classificatória, objetivomaníaca e indicemaníaca; tornar-se-ão exímios em criar receitas próprias por expropriação das famílias ou pilhagem do descanso e da vida pessoal dos docentes, exercendo toda a sua criatividade na destruição da criatividade e da diversidade universitárias, normalizando tudo o que é normalizável e destruindo tudo o que o não é. 

Os professores serão proletarizados por aquilo de que supostamente são donos — o ensino, a avaliação e a investigação — zombies de formulários, objetivos, avaliações impecáveis no rigor formal e necessariamente fraudulentas na substância, workpackages, deliverables, milestones, negócios de citação recíproca para melhorar os índices, comparações entre o publicas-onde-não-me-interessa-o-quê, carreiras imaginadas como exaltantes e sempre paradas nos andares de baixo. Os estudantes serão donos da sua aprendizagem e do seu endividamento para o resto da vida, em permanente deslize da cultura estudantil para cultura do consumo estudantil, autônomos nas escolhas de que não conhecem a lógica nem os limites, personalizadamente orientados para as saídas do desemprego profissional.

O serviço da educação terciária estará finalmente liberalizado e conforme às regras da Organização Mundial do Comércio. Nada disto tem de acontecer, mas para que não aconteça é necessário que os universitários e as forças políticas para quem esta nova normalidade é uma monstruosidade definam o que tem de ser feito e se organizem eficazmente para que seja feito. Será o tema da próxima crônica.

Boaventura de Sousa Santos é sociólogo e professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (Portugal).

Conama aprova texto-base sobre metodologia para recuperação de APP


O plenário do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) aprovou nesta quarta-feira (25) texto-base de resolução sobre metodologia de recuperação de Áreas de Preservação Permanente – APP, durante a 99ª Reunião Ordinária, em Brasília. Até o início da noite, ainda estavam sendo discutidas emendas ao texto-base e o debate deve ser retomado no segundo dia de reunião.
O texto-base já havia sido aprovado pelas Câmaras Técnicas de Gestão Territorial e Biomas e de Assuntos Jurídicos do Conama e aguardava o pedido de vistas de duas entidades da sociedade civil organizada. No texto aprovado é definida a metodologia para recuperação das APPs, consideradas de interesse social pelo Código Florestal. “A resolução, caso aprovada, será um instrumento na mão do produtor rural para que ele possa fazer a recuperação das áreas de preservação permanente sem burocracia”, explicou o diretor do Departamento de Florestas do Ministério do Meio Ambiente, João de Deus Medeiros. A idéia é que aconteçam, voluntariamente, ações de restauração e recuperação de APP.
De acordo com o texto-base aprovado, a recuperação de APP poderá ser feita por três métodos: condução da regeneração natural de espécies nativas; plantio de espécies nativas; e plantio de espécies nativas conjugado com a condução da regeneração natural de espécies nativas. Em seguida, cada uma das possibilidades é detalhada.
Resolução 303/2002 – Ainda em relação à APP, foram aprovadas pelo plenário do Conama as alterações na Resolução 303/2002, que trata dos parâmetros, definições e limites relativos às APPs. As alterações têm por objetivo aprimorar a norma, retirando dela o que seriam simples repetições do Código Florestal e reformulando definições que provocaram insegurança e distorções na aplicação da norma.
De acordo com João de Deus Medeiros, Diretor do Departamento de Florestas do MMA, são três os pontos essenciais alterados na Resolução. O primeiro diz respeito à APP de margem de rio, com a alteração do conceito de “nível mais alto”; o segundo à metodologia para medição das áreas de topo de morros; e o terceiro que retira do texto a parte que define como APP, nas restingas, uma faixa de 300 metros a partir da linha de preamar máxima.
Pela manhã, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, abriu os trabalhos do Conama e lamentou o grande número de queimadas no País, ressaltando que 7 mil bombeiros estão trabalhando no combate aos incêndios, além de homens do Exército e brigadistas. Durante o encontro, a ministra também falou sobre a iniciativa do MMA em apresentar proposta alternativa à legislação que tramita no Congresso Nacional sobre o Código Florestal e que convidará os conselheiros do Conama a participar da discussão. Por fim, enfatizou que, em relação à regulamentação da Política Nacional de Resíduos Sólidos, setores da sociedade serão consultados para a formulação do texto que vai detalhar a legislação a ser encaminhada ao Governo Federal. (Fonte: MMA)

REVISTA CIÊNCIA E MEIO AMBIENTE



CRITIQUES RÉCENTES ET PERSPECTIVES ACTUELLES DE LA THÉORIE DES ÉCOSYSTÈMES (CRÍTICAS RECENTES E PERSPECTIVAS ATUAIS DA TEORIA DOS ECOSSISTEMAS)
Denis Couvet e Anne Teyssèdre

RÉGULATIONS ÉCOSYSTÉMIQUES ET SOCIÉTÉS HUMAINES (REGULAÇÕES ECOSSISTÊMICAS E SOCIEDADES HUMANAS)
Pascal Acot

HISTOIRE DU CONCEPT D’ÉCOSYSTÈME (HISTÓRIA DO CONCEITO DE ECOSSISTEMA)
Patrick Matagne

EXTINCTION ET FONCTIONNEMENT DES ÉCOSYSTÈMES (EXTINÇÃO E FUNCIONAMENTO DOS ECOSSISTEMAS)
Julien Delord

LE RÔLE DE LA BIODIVERSITÉ DANS LE FONCTIONNEMENT DES ÉCOSYSTÈMES (O PAPEL DA BIODIVERSIDADE NO FUNCIONAMENTO DOS ECOSSISTEMAS)
Dominique GravelIsabelle Gounand e Nicolas Mouquet

ESPECIAÇÃO ESPONTÂNEA EM POPULAÇÕES ESPACIALMENTE DISTRIBUÍDAS E PADRÕES DE DIVERSIDADE (ESPÉCIATION SPONTANNÉE EN POPULATIONS DISTRIBUÉES DANS L’ESPACE ET PATRONS DE DIVERSITÉ)
Elizabeth M. Baptestini e Marcus A. M. de Aguiar

AS IMPLICAÇÕES ECOLÓGICAS DA VARIAÇÃO INTRAPOPULACIONAL (LES IMPLICATIONS ÉCOLOGIQUES DE LA VARIATION DES INDIVIDUS À L’INTÉRIEUR D’UNE POPULATION)
Márcio S. Araújo e Sérgio F. dos Reis

COMPONENTES FILOGENÉTICOS E ADAPTATIVOS EM PADRÕES ECOGEOGRÁFICOS (COMPOSANTS PHILOGÉNÉTIQUES ET ADAPTATIFS SELON DES PATRONS ÉCOGÉOGRAPHIQUES)
José Alexandre Felizola Diniz-Filho e Levi Carina Terribile

DISTRIBUIÇÕES DE ABUNDÂNCIAS DE ESPÉCIES (DISTRIBUTION D’ABONDANCES D’ESPÈCES)
AVANÇOS ANALÍTICOS PARA ENTENDER UM PADRÃO BÁSICO EM ECOLOGIA (PROGRÈS ANALYTIQUES POUR COMPRENDRE UN PATRON EN ÉCOLOGIE)
Paulo Inácio K. L. Prado

A ESTRUTURA E A DINÂMICA EVOLUTIVA DE REDES MUTUALÍSTICAS (LA STRUCTURE ET LA DYNAMIQUE ÉVOLUTIVE DES RÉSEAUX MUTUALISTES)
Paulo R. Guimarães Jr.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Plano de Manejo da RPPN Graziela Maciel Barroso - 1999 - Volume II


Saneamento acessível


23/8/2010
Por Fabio Reynol
Agência FAPESP – A grande maioria das cidades brasileiras sofre, em maior ou menor grau, de contaminação por nitrogênio, particularmente de nitrato. As zonas rurais são contaminadas por causa do uso excessivo de fertilizantes e os solos urbanos recebem nitrogênio principalmente de fossas sanitárias ou mesmo de redes de esgoto sem manutenção ou mal projetadas.
Esse problema levou o grupo de pesquisa do Laboratório de Modelos Físicos do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo (IG-USP) a desenvolver uma fossa séptica que fosse mais eficiente e, ao mesmo tempo, acessível às populações mais pobres, que dependem principalmente desse tipo de saneamento.
O projeto Minimização dos Impactos dos Sistemas de Saneamento (Minisis), apoiado pela FAPESP por meio da modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular, analisou o problema de maneira ampla e resultou em uma série de contribuições ao sistema de saneamento por fossas sépticas.
“As fossas convencionais são bastante eficientes em degradar matéria orgânica infiltrada no solo, mas o seu rendimento é limitado para nutrientes, como o nitrogênio”, disse Ricardo Hirata, professor do IG-USP e coordenador do projeto. O resultado é a contaminação do ambiente por microrganismos e por nitrato (NO3), uma das formas que se apresenta o nitrogênio no ambiente e que é muito estável e móvel e pode permanecer por décadas nas águas subterrâneas.
A dificuldade de degradação do nitrato, aliada ao fato de derivar de uma fonte crescente, os dejetos humanos, fazem dele o contaminante mais abundante do planeta nas águas subterrâneas. “O nitrato não é o contaminante mais agressivo, mas com certeza é o mais comum e o que se apresenta em maior volume nos reservatórios de água subterrânea, os aquíferos”, disse.
O problema aumenta com o crescimento das cidades, cujas redes de coleta de esgoto nunca crescem na mesma proporção. O resultado é a permanência de nitrato no ambiente por períodos que podem chegar a centenas de anos.
O nitrato permanece nos lençóis freáticos e volta à população com a captação de água por poços ou nascentes, configurando-se em um grande problema de saúde pública. “Um dos mais sérios casos de contaminação é o da cidade de Natal (RN), cuja população consome água encanada com nitrato”, disse Hirata.
Em São Paulo, a situação também requer atenção, segundo o pesquisador, pois 75% dos municípios paulistas são abastecidos total ou parcialmente pela água que vem de fontes subterrâneas, muitas dessas vulneráveis à contaminação por fossas.
Sem condições financeiras de construir uma estrutura apropriada, muitos moradores cavam buracos simples no solo e que, frequentemente, encontram o nível freático. Esse recurso, chamado de “fossa negra”, é ainda mais nocivo ao ambiente, pois injeta o contaminante diretamente na água subterrânea, sem que nenhuma forma de redução do contaminante possa ocorrer no solo, onde se processa a maior parte da transformação bioquímica dessas substâncias nocivas, segundo o professor.

Desenvolvimento no local
Para desenvolver o novo modelo de fossa, o grupo da USP precisava de uma comunidade que não fosse atendida pela rede de esgoto. O bairro de Santo Antônio, no distrito de Parelheiros, zona sul de São Paulo, foi o escolhido.
Os pesquisadores acompanharam o desempenho de duas fossas pertencentes a moradores vizinhos. Uma delas, a fossa controle, era do tipo negro convencional. A segunda foi construída na casa ao lado segundo a tecnologia desenvolvida pelo grupo.
A fossa projetada pelos pesquisadores tem dois níveis. O primeiro é formado por óxidos de cálcio e de ferro, um rejeito da indústria siderúrgica com propriedades bactericidas. “Por ter um pH muito alto, próximo de 12, esse material consegue degradar vírus e bactérias com alta eficiência”, explicou Hirata.
Para o experimento a equipe conseguiu trazer escória do porto capixaba de Tubarão, que possui grande fluxo de exportações de minério de ferro. Após passar pela camada mineral, o líquido efluente percola para a segunda barreira reativa, composta por areia e serragem da madeira cedrinho. Os cavacos de madeira, que fornecem carbono ao meio por respiração aeróbica, consomem o oxigênio e propiciam que o nitrato seja reduzido bioquimicamente a um gás de nitrogênio.
O projeto foi bem-sucedido e a primeira camada eliminou 95% dos vírus e bactérias presentes. Já a barreira de serragem e areia degradou com eficiência 60% do nitrato encontrado, mas Hirata aponta que o conhecimento alcançado no experimento permite melhorar esse número para 80%.
A degradação do nitrato no novo sistema foi tema da tese de doutorado de Alexandra Vieira Suhogusoff, defendida este ano. A aluna foi orientada por Hirata e teve apoio FAPESP por meio de uma Bolsa de Doutorado Direto.
A redução dos microrganismos obtida na primeira camada da fossa rendeu a tese de doutorado de Jesse Stimson, da Universidade de Waterloo, no Canadá, instituição que colaborou com o projeto de pesquisa.
O trabalho ainda contou com equipamentos de monitoramento para controlar a quantidade de material lançado em cada fossa e permitir a retirada de amostras. Os resultados obtidos foram usados para construir modelos numéricos que indicaram a possibilidade de se repensar a ocupação urbana sem rede de esgoto, permitindo aumentar o número de fossas sem implicar contaminações das águas subterrâneas ou mesmo superficial.
“Como ela é mais eficiente, podemos aumentar em até 60% a densidade de fossas em um bairro, comparativamente à capacidade de suporte com uso de técnicas convencionais”, afirmou Hirata, ressaltando que o custo da obra é bem acessível, embora não tenha estimado o valor exato.
Outra vantagem é que a construção da nova fossa não exige treinamento específico de profissionais. “Qualquer pedreiro familiarizado com obras de poços é capaz de construir o novo modelo”, disse. Isso permite que seja utilizada mão de obra local, mais acessível financeiramente.

Poços mais seguros
Outro resultado do projeto foi o desenvolvimento de uma metodologia para avaliação sanitária de poços de água. Trata-se de um questionário simples com dez perguntas objetivas que exigem respostas simples de “sim” ou “não”, como “há criação de animais próxima ao poço?”, “o poço possui trincas na parede interna?” e “a água que sai da cozinha passa a menos de 10 metros do poço?”
Com ele, um agente de saúde pode fazer um levantamento da qualidade da água consumida em um bairro, uma vez que a qualidade do poço é estimada a partir do número de respostas positivas recebidas.
“É um modo simples de municiar os órgãos de saúde pública na importante questão do consumo de água na área periférica de cidades”, sugeriu Hirata, que alertou para o fato de a população não possuir parâmetros objetivos para avaliar a água de seus poços.
“Para muitos, a água cristalina e fresca é sinônimo de água potável e, como as doenças provocadas pela contaminação aparecem esporadicamente, eles não associam essas doenças à qualidade da água”, apontou. O questionário foi adaptado de uma metodologia desenvolvida na Inglaterra e aplicada com sucesso em alguns países africanos.
Segundo o professor do Instituto de Geociências da USP, a fossa e o questionário desenvolvidos nessa pesquisa são soluções baratas e que podem ajudar especialmente as áreas mais afastadas e carentes enquanto não recebem rede de esgoto.
“O ideal seria que todos tivessem coleta de esgoto, porém, como nossa experiência mostra que a área de saneamento não costuma contar com muitos recursos, essas soluções poderiam amenizar muito a contaminação da água e reduzir os problemas de saúde da população”, disse Hirata. 

domingo, 22 de agosto de 2010

Qualidade dos serviços e políticas públicas

Assim como na educação, me parece que os serviços públicos de abastecimento e saneamento estão atingindo a universalidade brasileira. No entanto assim como na educação, vale um questionamento: como está a qualidade desses serviços?

Com respeito a coleta e destinação de resíduos sólidos, por exemplo, quanto se está separando, coletando seletivamente e se destinando a reciclagem? Quanto se está investindo em campanhas de re-uso de materiais? Como a política pública trata a responsabilidade das empresas em recolherem materiais possíveis de serem reutilizados e mesmo reciclados? Quantos municípios coletam lixo nas áreas rurais? Quantos ainda destinam para lixões? Quantos reaproveitam a energia dos aterros sanitários?

Com respeito ao abastecimento de água. Incrível que uma boa parte da população ribeirinha da região amazônica, no período menos úmido fiquem sem acesso a água de boa qualidade. E mesmoa água nas grande cidades, o quanto ainda é desperdiçada por vazamentos nas tubulações? E o custo de captação e tratamento, cada vez mais alto devido a contaminação de rios e represas, como o caso do Rio Tietê, represas Billings e Guarapiranga.

E o esgoto, esse então, ainda que esteja sendo coletado, para onde está indo? Quais as soluções técnicas adotadas para  a destinação e tratamento?  Fossas são adequadas para regiões de alta pluviosidade? Nem todos tem recursos individuais para contratarem limpa- fossas, sobretudo no período de verão em que se esgotam rapidamente.

Existem alternativas de tratamento que pouco são adotadas como por exemplo o sistema de wetlands.

Portanto, não basta aceitarmos os números pura e simplesmente sem um olhar crítico, pois se indicam que os serviços estão aumentando, não indicam que estão melhorando a vida das pessoas e em consonância com a melhoria da qualidade ambiental.

Davis

PNSB 2008: Abastecimento de água chega a 99,4% dos municípios, coleta de lixo a 100%, e rede de esgoto a 55,2%

Entre 2000 e 2008, o percentual de municípios brasileiros que tinham rede geral de abastecimento de água em pelo menos um distrito aumentou de 97,9% para 99,4%; o manejo dos resíduos sólidos (que inclui coleta e destinação final do lixo e limpeza pública) passou a existir em todos os municípios em 2008, frente a 99,4% deles em 2000;e os serviços de manejo de águas pluviais (drenagem urbana), que existiam em 78,6% dos municípios em 2000, chegaram a 94,5% em 2008. Nesses oito anos, o único serviço de saneamento que não chegou próximo à totalidade de municípios foi a coleta de esgoto por rede geral, que estava presente em 52,2% dos municípios em 2000 e passou a 55,2% em 2008. Entretanto, nos municípios em que o serviço existia, houve, no mesmo período, um aumento dos que registraram ampliação ou melhoria no sistema de esgotamento, de 58% para 79,9% do total, e dos domicílios atendidos, de 33,5% para 44%. Em 2008, 68,8% do esgoto coletado era tratado – percentual bastante superior aos 35,3% de 2000, embora menos de um terço dos municípios (28,5%) fizessem o tratamento, com acentuadas diferenças regionais nesse percentual, que alcançou 78,4% dos municípios no estado de São Paulo e 1,4% no Maranhão.
Em oito anos, o percentual de municípios que destinavam seus resíduos a vazadouros a céu aberto caiu de 72,3% para 50,8%, enquanto os que utilizavam aterros sanitários cresceram de 17,3% para 27,7%. Ao mesmo tempo, o número de programas de coleta seletiva dobrou, passando de 451 em 2000 para 994 em 2008, concentrando-se, sobretudo, nas regiões Sul e Sudeste, onde, respectivamente, 46% e 32,4% dos municípios informaram ter coleta seletiva em todos os distritos. Esses são alguns dos destaques da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB) 2008, que investiga os serviços de abastecimento de água, esgotamento sanitário, manejo de águas pluviais e manejo de resíduos sólidos, tendo como fonte de informação as entidades formais (com CNPJ) prestadoras desses serviços em todos os municípios brasileiros. Essas entidades englobam órgãos públicos ou privados, tais como autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista, consórcios públicos, empresas privadas, fundações, associações etc. A pesquisa foi realizada em convênio com o Ministério das Cidades e contou com a participação de pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e de técnicos especialistas da área.
De acordo com a PNSB 2008, em somente 17% dos municípios as prefeituras realizavam o abastecimento de água de forma exclusiva, ficando a prestação desse serviço, em maior medida, com outras entidades (58,2%) ou de forma combinada (24,7%). A situação se invertia quando se tratava do serviço de coleta de esgoto: em 55,6 % dos municípios, as prefeituras executavam o serviço de forma exclusiva, e 41,6% tinham a execução sob a responsabilidade de outras entidades. O manejo de águas pluviais era executado quase que exclusivamente pelas prefeituras municipais (98,6%). No manejo dos resíduos sólidos a maior parte das prefeituras se incumbia exclusivamente da prestação dos serviços (59,1%), enquanto em 31,2% delas a forma de execução compreendia outras entidades.
Quanto à existência de instrumentos legais reguladores dos serviços de saneamento básico, constatou-se que o abastecimento de água era regulado em 32,5% dos municípios, o esgotamento sanitário, em 18,4%, e o manejo de águas pluviais, em 18%.
Fonte: IBGE

Encontro da ANPPAS

A diversidade de assuntos e atualidade desse evento o faz um dos mais importantes do Brasil, quando se trata da temática ambiental.

V ENCONTRO NACIONAL DA ANPPAS - FLORIANOPOLIS 4-7 OUT 2010

O tema será "Anppas 10 anos: avaliando os desafios teóricos e as novas agendas públicas." Com este tema a diretoria propõe uma avaliação das transformação das diversas áreas de pesquisa envolvidas na ANPPAS, num diálogo entre a produção acadêmica nacional e internacional.
 
 
Grupos temáticos 
O conselho científico do V Encontro da Anppas agradece à toda a sua comunidade pelo empenho no envio de propostas para os novos GTs.
Ao todo, foram pouco mais de 40 propostas de altíssima qualidade, fato que dificultou bastante o processo de avaliação.

Abaixo você confere a lista de GTs do próximo encontro da ANPPAS. Nos próximos dias, estaremos divulgando maiores detalhes, como os nomes dos coordenadores e as sinópses relativas às propostas de trabalho dos GTs.


GT1 - Turismo, Ambiente e Sociedade
GT2 - Espaços socioambientais, mediação e conflitos rurais
GT3 - Políticas públicas e meio ambiente
GT4 - Mudanças ambientais e agravos à saúde humana
GT5 - Alternativas comunitárias de conservação da bio e sociodiversidade
GT6 - Sociedade, Ambiente e Educação
GT7 - Sociedade, Mercado e Sustentabilidade
GT8 - Mídia e Ambiente
GT9 - Água: território, democracia e governança
GT10 - Teoria Social e Meio Ambiente: avanços e desafios
GT11 - Mudança climática e as cidades
GT12 - Sistema de uso comum de Recursos Naturais: dinâmica social e política
GT13 - Meio Ambiente e Consumo
GT14 - Desenvolvimento, Meio Ambiente e População
GT15 - Relações Internacionais e Meio Ambiente
GT16 - Direito Ambiental e Ordenamento Territorial
GT17 - Energia e Meio Ambiente
GT18 - Governança e conservação dos biomas brasileiros à luz da Teoria dos Comuns
 

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

O MEGA-ESTALEIRO EM BIGUAÇU, A CIÊNCIA E O DIA DA VERGONHA

 Leopoldo Cavaleri Gerhardinger 
         Oceanógrafo – Universidade do Vale do Itajaí (2004)
         Msc. em Conservação - University College London (2008)
         Doutorando Programa Interdisciplinar em Ambiente e Sociedade – NEPAM/UNICAMP

       Não durmo direito desde a noite da última quinta feira (22.07.2010). As imagens, falas e angústias de uma minoria presente na audiência pública do processo de licenciamento ambiental do estaleiro OSX simplesmente não me deixam em paz.
       O mega-estaleiro da empresa OSX, previsto para se instalar em Biguaçu, na baía Norte da Ilha de Santa Catarina (Florianópolis) vêm recebendo o apoio de gente de peso no cenário político nacional, o engajamento total do poder público municipal e estadual, a ajuda do órgão ambiental estadual, a voz parcial de parte significativa da mídia catarinense e pasmem, o apoio das universidades. Não bastasse o próprio reitor da Universidade Federal de Santa Catarina manifestar-se publicamente favorável ao estaleiro, muitos professores e ex-alunos do curso de oceanografia, biologia e engenharia ambiental da Universidade do Vale do Itajaí estão envolvidos diretamente com o projeto. Ali mesmo já foram anunciados a intencionalidade de convênios e parcerias com as universidades para o monitoramento ambiental após a construção do estaleiro. A história se repete. Estes grupos articulam favoráveis ao empreendimento, juntando forças num grito impositivo “O estaleiro tem de sair a todo custo!”.
        Neste contexto insano, o papel de um Estudo de Impacto Ambiental (EIA), como aquele preparado pela empresa Caruso JR, é o de subsidiar tecnicamente com ‘certeza e previsibilidade’ o argumento e interesse econômico e político do modelo de desenvolvimento vigente no nosso país. As informações, estudos, conhecimentos e conclusões apresentadas pelos técnicos da empresa de consultoria durante a audiência parecem que foram todos meticulosamente organizados e arranjados para apontar na mesma direção, qual seja, apresentar este mega-projeto como uma iniciativa de ‘Desenvolvimento Sustentável’. O desdobramento argumentativo apresentado na audiência parece chegar sempre à mesma conclusão final, independente dos aspectos em questão: biológicos, sociais, econômicos, culturais. Quando a trama desta complexa equação parece que fica capenga em algum aspecto da sustentabilidade, a palavrinha ‘compensação’ ou ‘mitigação’ aparece como um ingrediente mágico que preenche o discurso com a desejada segurança, previsibilidade e certeza. Outro artifício empregado com a mesma finalidade é a apresentação de mais um entre tantos outros ‘Programas de Monitoramento ou Apoio’ de coisas, outras coisas e mais coisas. Há resposta e jeito pra tudo! Trata-se de um estudo de mais de 1000 páginas, que envolveu dezenas de oceanógrafos, biólogos, engenheiros ambientais. Muitos destes meus colegas de graduação, antigos mestres, e colegas de profissão. O custo total financeiro de tal estudo não posso imaginar. Consigo, no entanto, sentir uma profunda decepção e preocupação com o futuro da vida humana e biológica da zona costeira catarinense.
        Fazer a revisão integral de um estudo tão volumoso como este não é tarefa fácil e rápida, requer a imersão de muitas pessoas por muitas horas de leitura e reflexão crítica. Um grupo de cientistas do Instituto Chico Mendes de Conservação da Natureza (ICMBio) prestou-se à esta tarefa. Este é o órgão ambiental federal responsável por três Unidades de Conservação Marinhas localizadas imediatamente no entorno do estaleiro proposto. A Reserva Biológica Marinha do Arvoredo, Estação Ecológica Carijós e a Área de Proteção Ambiental do Anhatomirim dispensam maiores apresentações. Estas são todas áreas reconhecidas pelo Ministério do Meio Ambiente com altíssima relevância para a conservação da biodiversidade brasileira e para a manutenção dos recursos pesqueiros da região. Desde 2001 venho desenvolvendo pesquisas sobre a fauna de peixes da região. A área é realmente única!
        Assim como no EIA da empresa Caruso JR, o parecer técnico do ICMBio foi também substanciado em conhecimento científico, e conclusivo ao dizer que o empreendimento trará prejuízos irreversíveis, uma catástrofe ambiental e socioeconômica para a região. Outros pareceres técnicos elaborados por pesquisadores sem vínculo com a empresa de consultoria também apontam para uma direção geral oposta àquele apresentado pela Caruso JR. Busquem na internet, está tudo disponível para o nosso espanto. 
       Em quem acreditar? Uma grande contradição, conhecimento científico vs conhecimento científico. De que lado mora a tão desejada segurança, previsibilidade, certeza? Porquê não houve espaço para a manifestação oral dos profissionais do ICMBio em nenhuma das audiências públicas? Será que um oceanógrafo, um biólogo ou engenheiro ambiental tem a competência técnica para predizer as mudanças sociais, culturais e econômicas de um projeto de 3 bilhões de reais e assegurar a sua sustentabilidade a longo prazo? O que diria um velho pescador que conviveu diretamente, intimamente com o mar por mais de 60-70 anos? 
        Na semana que antecedeu a audiência pública, tive a oportunidade de entrevistar muitos antigos pescadores da região de Porto Belo, Bombas e Bombinhas sobre as mudanças que cada um acompanhou no mar ao longo de sua vida, como parte de uma pesquisa que estou envolvido. Estas pessoas possuem um profundo conhecimento sobre o oceano e seus ciclos, e suas perspectivas para o futuro do litoral catarinense não são nada boas. Durante a apresentação da audiência do EIA pelo técnico da empresa Caruso JR, pensei muito nos pescadores e no que diriam sobre os impactos do estaleiro. Somente dois jovens pescadores artesanais estavam presentes na audiência. Vieram de Biguaçú até o luxuoso auditório do Sports Center no bairro Jurerê Internacional para acompanhar a audiência. Fiquei pasmo ao saber deles que os verdadeiros pescadores foram ignorados no diagnóstico elaborado pela empresa. Um deles, transtornado com o que via e ouvia, me disse que há anos vêm tentando sem sucesso uma licença ambiental para pescar de arrasto. Num instante, ele via a possibilidade da sua família se manter na pesca escorregar por entre seus dedos enquanto uma outra licença ambiental estava em vias de ser promulgada para a construção do estaleiro, pois a autoridade do saber científicoassegurava um projeto de ‘Desenvolvimento Sustentável’ para a região.
        Pensei na mesma hora no que ouvi durante as entrevistas que fiz na semana anterior. Primeiro veio a Reserva Biológica Marinha do Arvoredo, criada de forma impositiva pelo Estado em 1990 e eliminando a possibilidade dos pescadores dali pescarem a anchova e a lula, pesqueiros que utilizavam há várias gerações. Agora vem um importante empresário e como num passe de mágica ameaça toda a sua sobrevivência, e a própria sustentabilidade da Reserva Biológica. Um total contrasenso! Eu também ficaria no mínimo transtornado. Os dois colegas tremiam suas mãos de angustia durante a apresentação da audiência, e ao serem chamados para uma manifestação oral à qual estavam inscritos, não compareceram. Logo entendi que o efeito do poder e autoridade técnica e política presente foi como uma bomba opressora na sua voz.
        Cheguei a esta conclusão pois também eu me senti oprimido, mesmo acostumado com o dialética argumentativa científica e sem o vinculo direto de dependência cultural e socioeconômica com a área. Eu tremia ao assistir muitos e muitos dos meus colegas de faculdade, antigos professores e mestres observarem atentos à minha manifestação oral. A maioria deles davam suporte técnico favorável à sustentabilidade do empreendimento, cada um em sua disciplina e sob as mais diversas justificativas pessoais e profissionais. Num misto de profunda decepção e choque ético, tentei fazer diversas perguntas que não foram respondidas pelas empresas Caruso JR e OSX.
        Por exemplo, eu queria saber porquê o estudo sobre os impactos deste mega-estaleiro sobre os peixes da região era tão fraco. Fiquei perplexo ao ler o volume III do EIA à página 299 em seu capítulo 5. O estudo de ictiofauna marinha (fauna de peixes) apresentado é de péssima qualidade e descompromissado com a relevância que este grupo possui para a biodiversidade e para a sustentação de milhares de famílias da região. Um indicador da falta de cuidado e incompetência técnica dos meus colegas se percebe na lista total de espécies de peixes marinhos presentes na área. De um total de 52 espécies listadas no EIA (numero total certamente subestimado), 20 espécies (40%) tinham seus nomes científicos equivocados. Além disto, duas espécies de ‘lebiste’, isto mesmo, aquele peixinho colorido de água doce comumente utilizados para a aquariofilia ornamental, constam na lista de peixes marinhos e são descritos como indicadores de corpos de água degradados por ação antrópica. Erros simples, banais, pode-se dizer, mas sobretudo reveladores. Oras bolas! Para mim ficou claro que estes fatos estão na superfície de um estudo de impacto ambiental feito no mínimo sem a pratica do cuidado por profissionais sem competência na área.
        Quando fiz minha matricula no curso de oceanografia na Universidade do Vale do Itajaí, perseguia um re-encontro com as fantasias de uma infância vivida entre a beira-mar e as aventuras do Jacques Costeau. Foram 5 extasiantes anos aprendendo as ciências marinhas, incorporando na minha cesta de saberes as teorias sobre os peixes, algas, correntes e marés. Tive muitos mestres, todos doutores do conhecimento e referências nacionais - alguns internacionais - no conhecimento sobre o litoral brasileiro. O universo do conhecimento é instigante, e traz com freqüência a promessa de seguranças e certezas sobre o entendimento do funcionamento do mundo ao nosso redor, além de garantir maiores chances de estabilidade econômica pessoal. Acontece que esta é uma perigosa armadilha. Nestes últimos anos, estudiosos de todas as áreas do conhecimento científico parece que concluem em conjunto: a economia, a ecologia, a sociedade são imprevisíveis, as coisas são complexas e altos níveis de incerteza estão quase sempre presentes em qualquer sistema analisado! O fio condutor da vida é delicado e exige o cuidado, a precaução diante da famigerada vontade humana de crescer, crescer e crescer indefinidamente. As manchetes estão cheias de exemplos. “Catástrofe ambiental no Golfo do México envolvendo uma das maiores empresas de petróleo do planeta!”, “Queda imprevisível das bolsas de valores na Europa!”, “Contaminação de ostras e mexilhões em Santa Catarina!”, entre outras. 
        O mundo da consultoria ambiental pode trazer dinheiro fácil para complementar a renda do cientista, do professor universitário ou do recém formado. Mas se entra no bolso em prejuízo da sobrevivência de milhares de pescadores, de impactos irreversíveis à biodiversidade, e da impossibilidade de levar meus filhos para comer um peixe assado ou um caldo de garoupa sem contaminantes, ESTOU FORA! Sou partidário da opinião de que há espaço para crescimento pessoal e profissional compromissado com o discurso e prática pela vida. Universidade, ciência, ainda acredito. Mas no dia 22 de julho de 2010 senti vergonha do meu diploma de oceanógrafo.